Músico e compositor, Daniel Rachel escreveu em parceria com a
jornalista Caroline Sullivan o livro “Isle of Noises”, que reúne
entrevistas com diversos músicos britânicos famosos. O foco das
conversas está no processo criativo utilizado naquelas que podem ser
consideradas as maiores pérolas da música pop mundial. Com a
palavra nomes como Ray Davies (The Kinks), Jonny Marr (The Smiths),
Lily Allen e outros. Selecionei trechos, a partir de material
publicado no The Guardian de hoje, com o depoimento das seguintes
figuras:
John Lydon, Sex Pistols
(Show com a banda PIL, em 1986 / Ives Lorson - Wikimedia)
DR: Você carrega um caderno para anotar frases ou ideias?
JL: Não. Eu nunca faria isso. Urrgh, não sou um integrante
do The Clash. Eu me lembro que o Joe Strummer costumava assistir o
The News at Six* e anotar os slogans e frases que seriam utilizadas
nas canções. Ele não perdia tempo e escrevia coisas como “sten
guns in Knightsbridge**” e “White Riot”. Além de ser
totalmente fabricado, considero isso ridículo!
Mick Jones, The Clash
Show no Carbon Casino, em 2008. (Pmsphoto - Wikimedia)
DR: Como é que você e Joe Strummer uniam suas ideias para então
levá-las ao resto da banda?
MJ: Às vezes eu andava com um gravadorzinho de fita cassete.
“Complete Control”, por exemplo, foi feita assim. Em “London
Calling” fechamos a letra, mas acabei dando uma suavizada na música
que antes tinha uma batida mais robusta... Acho que essas canções
vinham quase prontas... Somente mais tarde é que nós partimos para
uma pegada mais experimental. Mas, depois, tivemos que cortar esse
lado também. A exemplo das duas ideias para “Casbah”***. Bernie
[Rhodes]**** disse: “Porque tudo que vocês fazem tem que ser
raga?”. Você sabe, aquela música longa... no mesmo ritmo de
sempre. Nesse dia, enquanto o aiatolá dizia que não gostava de
rock'n'roll, Bernie nos pedia para encurtar tudo. Então o Topper
entrou no estúdio, foi incrível. Ele pegou três coisas: o baixo, o
piano e a bateria. Eu fiz o refrão “Shareef don't like it”,
enquanto o Joe fez a letra. No entanto, Topper foi o grande maestro.
Annie Lennox, Eurythmics
Fac-símile capa do disco Revenge (Reprodução - Wikimedia)
DR: Você continua tomando conta de tudo nas composições como na
época da parceria com Dave Stewart?
AL: Eu nunca pensei dessa maneira, acontece que eu escrevia as
letras e o Dave trabalhava como um tutor/mentor nesse departamento
(composição). Às vezes, eu escrevia 90% de uma canção... como em
“Sisters Are Doin' It for Themselves” ou “There Must Be an
Angel (Playing With My Heart)”, onde o Dave contribuiu com ótimas
sacadas musicais em termos de forma e estrutura. Ele também ajudou
bastante em ideias que começaram do zero, como “Sweet Dreams” e
“Here Comes the Rain Again”. Em razão de ser aficionado por
tecnologia de ponta, Dave era definitivamente o responsável pela
parte técnica do processo de gravação. Nesse sentido, ele pode até
ser considerado o “produtor”, embora eu também atuasse de forma
mais orgânica na produção. Nós sempre dividimos tudo meio a meio,
e é assim que enxergamos a nossa parceria.
* Noticiário da BBC de Londres, talvez comparado ao Cidade Alerta.
** Verso da canção 1977, do disco The Clash. Knightsbridge é um
bairro de Londres, em livre tradução a frase seria algo como “as
pistolas alemãs em Knightsbridge”.
*** Rock The Casbah, canção do disco Combat Rock.
**** Produtor e empresário da banda The Clash.